sexta-feira, 1 de julho de 2011

O Código do Atraso x A Emancipação da Consciência Feminina

By Irenaldo Araújo   Posted at  20:00   No comments

Por: Adriana Amâncio
Assessora de Comunicação da Diaconia

     O que mais pode ser dito a respeito do novo Código Florestal? O longo e desgastante processo de votação do novo texto foi suficiente para que, praticamente se esgotassem os argumentos a favor da flexibilização, por parte da bancada ruralista e contra o desmatamento, por parte dos que têm consciência da realidade de mudanças climáticas e desastres ambientais vivenciadas, sobretudo nos tempos atuais.

     Não menos recorrente do que a questão que limita-se a decidir por aprovar o Código ou vetá-lo, foi a questão que entende este impasse como sendo mais um confronto entre um projeto de desenvolvimento baseado em uma exploração desregrada dos recursos naturais e outro que reconhece a necessidade de conviver em comunhão com a Terra e com isso assegurar as vidas humanas que nela habitam.  Diante desta abordagem cabe um novo olhar sobre o fato. Um olhar que compreende o novo Código Florestal como “código do atraso” e a relação estabelecida pelas mulheres com o meio ambiente, pautada em cuidado e respeito, como o reflexo de uma consciência emancipadora. Pode estar na consciência feminina uma das fontes de inspiração para que se entenda definitivamente que nós e os recursos naturais somos temporais e não eternos.

     O Código Florestal é a lei que dispõe de regras sobre a preservação ambiental em propriedades rurais. A primeira versão aprovada em 1934 e juntamente com outras medidas como a Lei de Gestão de Florestas Públicas (Lei 11.482/06), a Lei da Mata Atlântica (Lei 11. 428/06) e a aprovação de decretos como o 6. 321/07 e 6.514/08 foram responsáveis por uma década de mudanças significativas no processo de desmatamento dos biomas brasileiros. A devastação da Floresta Amazônica diminuiu em quase quatro vezes. Entre os anos de 2004 e 2010 foram criados quase 300 mil Km² de Unidades de Conservação (UC). Some-se a isso a apreensão de 1.500 empresas clandestinas de extração de madeira da floresta (Capobianco).

     O novo Código Florestal, atualmente em análise no Senado, entre outros retrocessos prevê: isenção aos pequenos produtores rurais, desobrigando-os de recompor a vegetação em propriedades de até quatro módulos fiscais, consolidação de cultivos em Áreas de Preservação Permanente (APPs), o que permite cultivos nestas reservas até então protegidas pela legislação vigente, aumento da área de cultivo nas margens dos rios e, anistia à quem desmatou floresta no período de julho de 2008 até agora, desde que este faça adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA). Contrapondo os avanços dos últimos dez anos e as novas propostas do Código Florestal, salta aos olhos retrocesso do Estado Brasileiro em relação a qualidade de vida das gerações futuras, justificando assim a expressão aqui adotada: “Código do Atraso”.

     Ainda que distantes em representação política quantitativa e qualitativa, as mulheres emitem seu exemplo de emancipação em relação a aprovação do “Código do Atraso”.  Em tempos de economia globalizada, paramentada em projetos tecnológicos cada vez mais ousados, “elas estão voltadas para relações estratégicas de longo prazo que dão prioridade para as gerações futuras”, escreve Shanon Hayes em seu livro Radical homemakers: reclaiming domesticity from a consumer culture (Donas de casa Radicais: recuperação doméstica a partir de uma cultura de consumo) dedicado as  donas de casa radicais. Elas, mulheres, muitas vezes renegam a vida desejosa de consumo imposta pela sociedade atual, para dedicar-se ao cultivo dos alimentos básicos que suprem a necessidade da família nos arredores de casa. O cerne da questão não é a opção pelo espaço privado em detrimento da participação das mulheres na vida pública, mas, a opção sobretudo política, das mulheres de conviverem com o necessário produzido em comunhão com a natureza. Desde a década de 80, diversos cientistas desenvolvem pesquisa sobre as peculiaridades de homens e mulheres na relação com a preservação ambiental. A maioria desses estudos concluiu que as mulheres se mostram efetivamente preocupadas com a destruição do meio ambiente.

      A proximidade entre as mulheres e o meio ambiente também se reflete por meio de dados que apontam para elas, como sendo o público alvo dos desastres ambientais. Dados do de um relatório da Women’s Enviromental Network (WEN – Rede Ambiental de Mulheres), uma organização baseada no Reino Unido, afirmam que 10.000 mulheres morrem anualmente em decorrência de desastres ambientais, contra 4.500 homens. O público feminino compõe 80% do total de refugiados das catástrofes naturais. O relatório ainda indica que de 26 milhões de pessoas que perderam suas casas e seus meios de sobrevivência em razão da mudança climática, 20 milhões são mulheres. Ainda assim, ou quem sabe especialmente por esta razão, elas atuam como verdadeiras “Guardiãs da Terra”, enquanto os patriarcas do mundo ignoram as mudanças climáticas dando passos para trás.

     Dados do Institute for War & Peace Reporting (IWPR) afirmam que a participação das mulheres nas rodadas de negociação e decisão política sobre questões ambientais é restrita. Este universo ainda é predominantemente dominado por homens. É no âmbito local, da construção das experiências que impactam sobre o equilíbrio ambiental que elas se destacam mais. 

     Constitui-se aí um paradigma que confrontam duas opções políticas de Sociedade. Uma, patriarcal, que estende esse poderio à natureza e outra, bem menos oportunizada que vislumbra “as vidas” como seres que devem viver em comunhão, sob um constante ciclo de cuidado.

     Além de tudo o que já foi dito, é conveniente salientar que de fato a questão do Código Florestal, contrapõe extremidades mais amplas do que o impasse entre aprovar ou vetar. Neste bojo, além dos confrontos entre projetos de desenvolvimento capitalista e desenvolvimento sustentável, está presente um desafio: democratizar a democracia para as mulheres.

 

Postado do site da Diaconia: http://diaconia.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=1535&Itemid=203

Sobre Irenaldo Araújo

Educador, graduado em Pedagogia e Especialista em Psicopedagogia, pelas Faculdades Integradas de Patos; Especialista em Educação Ambiental e Sustentabilidade, pela Universidade Federal de Campina Grande; Mestre em Ciências Florestais, pelo Programa de Pós-graduação em Ciências Florestais, da Universidade Federal de Campina Grande; Doutorando em Educação, pelo Programa de Pós-graduação em Educação, da Universidade Federal da Paraíba (Campus I).usto.
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    Educador, graduado em Pedagogia e Especialista em Psicopedagogia, pelas Faculdades Integradas de Patos; Especialista em Educação Ambiental e Sustentabilidade, pela Universidade Federal de Campina Grande; Mestre em Ciências Florestais, pelo Programa de Pós-graduação em Ciências Florestais, da Universidade Federal de Campina Grande; Doutorando em Educação, pelo Programa de Pós-graduação em Educação, da Universidade Federal da Paraíba (Campus I).